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Retrospectiva 2020: o ano em que o PIB percebeu o valor da Amazônia


Desde o início do ano, estava claro que o desmatamento da Amazônia seria um tema sensível ao governo em 2020. Já em agosto do ano passado, os números mostravam forte tendência de alta na destruição da floresta. As notícias corriam o mundo.


“Cerca de 150 homens com 80 motosserras derrubaram freneticamente árvores com mais de 20 metros de altura. A corrida para pôr abaixo uma área de cerca de 5.000 hectares antes da temporada de chuvas, em setembro, durou meses. Tudo aconteceu à luz do dia, para quem quisesse ver. No começo de agosto, botaram fogo em tudo. Foi assustador.” O relato do pecuarista mineiro Mauro Lúcio Costa dava o tom do que viria a seguir.


No início de 2020, líderes empresariais aumentaram o volume das críticas à política ambiental de Ricardo Salles, ministro do Meio Ambiente. A palavra catastrófico passou a ser frequentemente associada ao termo desmatamento.


Em março, estava claro o tamanho do problema. A Amazônia havia perdido, em oito meses, uma área equivalente a três cidades de São Paulo. De acordo com o sistema Deter, gerenciado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, de janeiro a abril foram perdidos 1.202 km² de florestas, um aumento de mais de 50% em comparação ao ano anterior. Neste momento, a pandemia adicionava mais um fator de risco, especialmente aos povos indígenas.


A pressão internacional não demorou a aparecer. Supermercados britânicos ameaçaram boicotar os produtos brasileiros; investidores europeus, que controlam 2 trilhões de dólares em ativos, ameaçaram desinvestir no Brasil; e gestores de fundos com 20 trilhões de ativos gerenciados, enviaram uma carta aberta ao governo brasileiro alertando que o desmatamento representa um risco sistêmico aos seus portfólios. Os investidores, por sinal, eram os mais preocupados.


Usualmente culpado pelo desmatamento, o agronegócio também se mostrou insatisfeito com o andar da carruagem. A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, se apressou em dizer que a agricultura e a pecuária brasileiras não precisam da Amazônia para crescer. As empresas do setor vislumbravam problemas para acessar mercados desenvolvidos, especialmente a Europa.


Em julho, numa iniciativa inédita, 38 grandes empresas brasileiras enviaram uma carta ao vice-presidente Hamilton Mourão pedindo o fim do desmatamento. Mourão já havia assumido o Conselho Amazônia, criado para coordenar as ações federais na região e para acalmar os ânimos dos estrangeiros. Entre as signatárias estavam Ambev, Cosan, Itaú, Klabin, Natura, Santander, Suzano e até a Shell. Em algumas semanas, o número de assinaturas chegou a quase 70.


Na tentativa de responder às críticas, o governo brasileiro editou um decreto proibindo as queimadas em todo o país por 120 dias. Mas, apesar do quase consenso entre investidores e empresários do tamanho do problema, o ministro da Economia, Paulo Guedes, viu “exagero” na reprovação da política ambiental de Salles.




 

O conteúdo disposto neste artigo foi originalmente publicado na Exame, sendo toda a responsabilidade, direitos autorais e crédito devido a seus autores.

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